Segundo ele, nasceu em Trás-os-Montes, onde aprendeu a contar com os dedos
e ler os grandes títulos dos jornais que enfeitavam as cozinhas daquela época.
Graças a um ferroviário que casou com a moça mais linda do povo, conseguiu que
este lhe ensinasse a juntar as letras para aprender a ler e, se possível a
escrever.
O pobre ferroviário nem sequer conseguia um momento libre para jogar uma
partida de cartas, porque muito antes de chegar à taberna já Elias o estava
esperando com um jornal velho debaixo do braço para uma explicação que por si
só não conseguia perceber. Num curto espaço de tempo, não havia na região quem
soubesse ler o jornal como ele. Até a página de necrologia não escapava aos
olhos do leitor. Todo o povo o respeitava e todo o povo lhe pedia não só para
ler as cartas que chegavam como para dar respostas às mesmas.
Este tipo de pessoas são adoradas por uns e odiadas por outros, porque o
seu protagonismo põe em causa a principal figura da Casa Grande, única fonte de
soberania e portando de sobrevivência. Um dia Elias teve a infelicidade de
dizer: --todos nós, não somos mais que uns escravos, mas o que não sei dizer é,
se tal escravidão é dirigida por Deus ou pelo amo! Sendo Deus o criador de
todas as coisas, como pode ser possível de cometer tais barbaridades de escravizar
todo um povo, a trabalhar desde que sai o sol, até que desaparece para alimentar
uma única Casa!..
Nesse mesmo dia, Elias foi apodado o Filósofo, tachado de louco e comparado
com um tal Zaratustra que tinha fugido para o alto de uma montanha sem ninguém
saber o seu paradeiro. Assim, Elias foi obrigado a abandonar o povo com uma
simples manta e um pau para defender-se de algum animal bravio. Nunca tinha
ouvido falar de Zaratustra e ao compararem-no a ele, alguma coisa haverá em
comum! Duvidoso e pensativo meteu pés a caminho sem descartar de um dia
encontrar dito Zaratustra. As distâncias de um povo a outro cada dia se
tornavam mais insuportáveis, a fome e a sede debilitavam-no de tal ordem que
apenas podia caminhar.
Antes de chegar a um povo qualquer, já tinha engendrado um discurso, sempre
com a frase em comum de dizer: - foi expulso da minha terra natal por aprender
a ler e a escrever. A continuação era contar as calamidades que se iam
amontoando no seu espirito, como se fosse a própria lepra sem nunca ter feito
nada de anormal, exceto de aprender a ler e escrever. As amáveis mulheres que
lhe davam de comer depois do discurso não só, conseguiram a sobrevivência de Elias
como também, a sentir-se aliviado ao dar-se conta que cada discurso que dava a
multidão era maior e toda ela o aplaudia com palmas.
Estes aplausos vindos de uma pobre gente, cheia de sacrifícios. Compartindo
a comida, quando a mesma nem sequer chegava para alimentar as suas famílias. Estas
ações são dignas de uma reflexão profunda para melhor compreender as causas
desta desigualdade existente num mundo de Deus! Esta pobre gente sem o saber,
reduziram o espírito de Elias a um ser insignificante. Segundo Deus pensava ele,
todos nós somos iguais, mas como o demonstra a realidade, a distância entre
humanos, ultrapassam os extremos em sentidos diferentes. Por um lado morrem de
fome por não terem nada para comer, por outro lado, morrem de uma indigestibilidade
por comerem em demasia.
Uns morrerem de fome, outros de fartura; aqui há qualquer coisa que está
fora dos limites da lógica. Aanalisando em profundidade este comportamento
humano, nos damos perfeitamente conta, que o que morreu indigesto cometeu dois
crimes, o primeiro foi ter comido a ração que não lhe pertencia, segundo foi
comer até morrer. Intrigado por estes factos anormais Elias encontrou-se numa
situação impossível de compreender, é normal que o Glutão que come o que não é
dele, para que outros não possam comer seja acusado de dois crimes, mas o que
não é de Direito e muito menos de Justiça é morrer de fome? Como é possível que
Deus tenha criado um Sol para iluminar e aquecer todo o mundo e que haja alguém
a morrer de frio? Onde está a justiça divina?
Estes acontecimentos quotidianos, deixaram Elias num
impasse de poder andar de povo em povo com os seus discursos, sem ter a certeza
se o que diz é verdade? Esta interrogação a ele próprio deixou-o fora de
combate, decidindo assim, em vez de discursar ir à procura de Zaratustra para
ver se entre os dois conseguem encontrar a solução de acabar com os Glutões
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